quinta-feira, 2 de outubro de 2008

O que esperar do futuro?


Participei esta semana do seminário Crie Futuros[1], uma linda iniciativa de Lala Deheinzelin[2], diretora da Enthusiasmo Cultural, e os assuntos abordados ali me inspiraram imensamente, como era programado, a pensar o que imaginar do futuro.

Primeiramente, afirmo que não é nada fácil imaginar um futuro muito diferente das maneiras de operar que temos estabelecidas. Muitas vezes, imaginamos um formato diferente, mas não uma operação diferente.

Se trabalhamos em escritórios, por exemplo, podemos nos imaginar a possibilidade de não termos que nos deslocar para trabalhar. Podemos pensar que, no futuro, as pessoas trabalharão desde as suas casas, pela Internet, e apenas interagirão pessoalmente com o mundo quando desejarem, pois tudo poderá ser feito a partir da tela do computador.

Entretanto, não conseguimos pensar em um tipo de trabalho diferente, em modelos de negócios diferentes, em estilos de vida diferentes. Apesar da diferença no formato, ainda nos imaginamos cada qual trabalhando para uma empresa, ou várias delas, recebendo uma certa quantia de dinheiro pelo trabalho, maior ou menor dependendo da expertise que temos; pensamos em lojas virtuais as quais poderemos acessar para fazer compras; pensamos no entretenimento que poderemos obter via internet, baixando filmes, ou músicas, assistindo shows ou lendo textos.

Modelos de futuros completamente diferentes são possíveis, e extremamente necessários. Veja-se o exemplo do Grameen Bank, desenvolvido em Bangladesh por Muhammad Yunus, com o objetivo de levar oportunidades sociais e econômicas para os cidadãos de baixa renda através de pequenos empréstimos, o que ajudou a tirar milhões da pobreza extrema[3]. Veja-se os modelos das Ecovilas, e das Ecocidades[4], que representam novas maneiras de organizações sociais, baseadas na troca, no trabalho conjunto, cooperativo, na reciclagem, no não consumismo.

Todas essas iniciativas são frutos do sonhar de indivíduos, ou grupos de indivíduos, que perceberam a necessidade de se desenvolver novas maneiras de vivência, de interação, de trabalho, de relação com o meio ambiente.

A sociedade que criamos e na qual vivemos hoje está incrivelmente equivocada. O dinheiro deveria ser apenas uma convenção, uma maneira de facilitar as trocas, mas acabou elevado a uma posição de necessidade primeira de uma vida, e hoje é medido através de indicadores que nada dizem a respeito do bem estar humano.

O que significa o PIB – Produto Interno Bruto? De que adianta tal indicador se ele não diz nada com respeito ao bem-estar da população? De que adianta saber quanto de dinheiro foi gerado em uma nação se esse dinheiro é horrivelmente mal distribuído, passando pelas mãos de poucos, mas gerado do suor de muitos? De que adianta o dinheiro, se hoje em dia ele não facilita mais nada, mas ao contrário, é causa de desavenças, inveja e ambição?

No futuro, os indicadores precisam ser outros, por exemplo, o Nível de Felicidade Expandida, ou ainda o Índice de Bem Viver, ou o Produto da Comunhão Cultural. Tudo isso poderá representar a mensuração do convívio, da boa saúde (bem distante dos hospitais!), da boa alimentação, das relações humanas e da celebração da diversidade cultural.

De que maneiras poderíamos tornar esses indicadores reais? Como medir essas intersecções intangíveis? Quando essas questões ocuparem indiscriminadamente o primeiro lugar nos nossos interesses, encontraremos sem titubeio uma fórmula de medi-las e fazerem-nas crescer exuberantemente.

Espero e acredito que, no futuro, conseguiremos focar nossas energias para o que realmente importa: a constante celebração da vida. As provas disso já são presentes.

[1] Realizado na Sede do SENAC São Paulo, dias 22 e 23 de setembro. Para mais informações, acesse: http://www.criefuturos.com.br/ e http://www.wikifuturos.com.br/.
[2] Lala Deheinzelin é uma profissional transdisciplinar cujo background de atuação na cultura (teatro, dança, cinema e TV) levou-a a concentrar uma expertise no uso das linguagens artísticas para melhor traduzir conteúdos, aplicada nas artes, universo corporativo e terceiro setor. Foi pioneira no Brasil na busca de estratégias e oportunidades para a Economia Criativa.
[3] O Grameen Bank ajuda a milhões de pobres de Bangladesh, a maioria mulheres, ao emprestar pequenas quantias de dinheiro para a abertura de negócios. Os créditos são geralmente utilizados na compra de animais de criação e para a aquisição de telefones móveis que podem ser utilizados em lugarejos sem acesso a telefonia fixa. Maiores informações em: http://www.acaodacidadania.com.br/templates/acao/novo/publicacao/publicacao.asp?cod_Canal=6&cod_Publicacao=1091.
[4] Ver mais informações em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ecocidade.
Foto: Alessandra Mara Vidotti.

4 comentários:

Anônimo disse...

envolto à veloz máquina social é difícil enxergar... a gente quer ser feliz, mas tem outras prioridades ...
e esquece q "ser feliz" é até mesmo ser mais produtivo....e tb melhorar o mundo, pq felicidade contagia.

celebremos a vida então. pq isso, ainda mudará o mundo.

Unknown disse...

Pô, que legal está isso aqui, Alê! Faz um tempão que eu não entrava.
Sobre a postagem, concordo plenamente com você, embora esteja atravessando uma fase de certa descrença em relação à mudança. Ou seria uma resignação... quem sabe. Espero que passe logo. Não sou, nesse momento, o melhor astral pra falar do assunto.
Beijo!

Leandro

Badah disse...

Maravilha Alê! Estou aqui numa imensa correria - juro que não a planejei - mas fiquei muito feliz com sua iniciativa e vim aqui conferir. Futuro, presente ou passado, estamos falando de ética né? Uma visão saudável como a sua vê a vida como uma manifestação sagrada e coletiva. Acho que o problema do "futuro hoje" é que a gente tende a pensá-lo como uma linha progressiva para frente, quando na verdade, futuro, passado e presente são construções pisiquicas - o futuro é agora e nos cobra nada mais nada menos do que aquilo que já escolhemos e não sabemos que escolhemos. Outro ponto fundamental é o "futuro para mim" e o "futuro para todos".

Todos os exemplos que vc citou falam de um futuro compartilhado, para todos. Ouvi certa vez numa aula, que se a nossa ação não puder ser universalizada, não é uma ação ética. E ponto. Agora, se já é difícíl enxergar o tempo como um sistema complexo, em que passado presente e futuro não são separados, imagine então pensar o outro como co-autor de minha existência. Mas é isso aí Alê, o caminho é esse! Nos cabe compartilhar, celebrar e contagiar! Bjs.

Anônimo disse...

olá, Alê!!

Que esteja tudo bem.
Que surpresa boa ler teu texto falando do futuro. Meu último texto fala sobre identidade, que é justamente o que dá sentido ao futuro. rs

beijão